sábado, 22 de outubro de 2011

O poço que não tem fundo




Domingo, 23 de outubro de 2011, por Danuza Leão, para a Folha de S. Paulo



Quando uma pessoa normal, como eu, precisa fazer uma pequena obra em casa _ infiltração no banheiro, por exemplo _, chama uma firma e pede um orçamento. Nesse orçamento está incluída a parte hidráulica, alguma coisa de eletricidade, mais o serviço do pedreiro, eventualmente alguns azulejos, e a pintura. Eu acho caro, peço mais dois orçamentos; um deles é a metade do primeiro, o outro, o dobro. Como saber qual é o preço justo? Essa é uma situação comum, mas que me paralisa.
Imagine agora um ministério distribuindo verbas imensas, para que crianças carentes participem do mundo dos esportes. Como saber o preço para manter 1.500 _ digamos _ adolescentes com uniformes, alimentação, mais o equipamento esportivo, manutenção das quadras, e por aívai? Quem controla o $$$ que cada ONG recebe? Aliás, é sempre bom desconfiar quando ouvir “sem fins lucrativos”. Quem paga com seu próprio dinheiro, procura encontrar os uniformes de preço mais razoável, as bolas de vôlei menos caras, a merenda mais adequada à garotada que pratica esportes; mas duvido que quem recebe o dinheiro do Ministério do Esporte faça como as pessoas comuns. Para eles, dinheiro do governo é uma coisa vaga, não tem dono, não é de ninguém.
Mas é, sim; é dinheiro nosso, e ontem, quando estava lendo as denúncias graves que atingem o ministro dos Esportes, o telefone tocou. Era o contador, dizendo quanto eu devo pagar de Imposto de Renda até o fim do mês _ o pagamento é trimestral. Como, segundo alguém, a parte mais sensível do ser humano é o bolso, doeu; doeu e eu senti, na carne, para onde meu dinheiro ia. Não dá.
Como bem diz nossa sábia presidente, todo mundo é inocente até prova em contrário, mas nunca se vai saber quais os critérios para decidir a que ONGs o dinheiro vai ser destinado, e por que aquelas, e não outras _ e quem recebe propina não assina recibo. Esquecendo a propina, que é um mero detalhe _ 20 % _, o fato de um ministério destinar tanto dinheiro para a Associação do Kung-Fu, para a Federação Paulista de Xadrez,para a Liga do Futebol Society do Distrito Federal, já seria motivo mais do que suficiente para demitir o ministro. Os que dançaram até agora foram da era Lula; quem é mesmo que enchia a boca quando falava em herança maldita? E cansa, ler e ouvir as mesmas palavras, sempre iguais: “nego todas as acusações”.
A Copa está chegando, envolve muita grana, cada um puxando a sardinha para sua brasa, as obras de estádios e aeroportos estão atrasadas, não dá para ter certeza de que tudo estará pronto, mas Deus é brasileiro, dizem. Eu não entendo de economia, mas sei que se qualquer pessoa, assim como qualquer país, gastar mais do que pode _ e mal _, não costuma dar certo. E o trem-bala, e a usina de Belo Monte? Nunca mais se ouviu falar.
Agora, parece que chegamos ao fundo do poço: já estão roubando merenda de criança. Mas que ninguém tenha ilusões: esse poço não tem fundo, e nunca vai se saber deninguém que tenha sido preso.
PS – Pelo que sei, as passeatas contra a corrupção, contra o voto secreto e a favor da ficha limpa é “combinada”, digamos assim, pelo face book, twiter, etc; e quem não frequenta as redes sociais, como vai ficar sabendo, para poder participar?

Um comentário:

  1. Muito bom Bebel!!!! Infelizmente este é o nosso país...mas felizmente ele está acordando, e os caras pintadas estão voltando...

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