domingo, 24 de junho de 2012

Foi no Hotel Ritz


  Domingo, 24 de junho de 2012, por Danuza Leão, para a Folha de S. Paulo


Foi uma paixão como costumam _ e devem _ ser as paixões: intensa e breve.

A primeira vez que se viram foi no Rio, e houve logo uma faísca. Para isso, ajudou muito o fato de ele ser comprometido, digamos assim, e seu comprometimento estar bem longe. Não demorou muito tempo para se apaixonarem, mas nunca fizeram juras de amor eterno; viveram um louco amor durante duas semanas, quando ela viajaria para Paris. Ele deu um jeito _ sempre se dá, quando se quer _, disse que  ia encontrá-la.

Ela chegou primeiro, para ter tempo de reconhecer a cidade, fazer o que as mulheres mais gostam, umas comprinhas, (o que não é possível, com um homem perto), e ir a um bom cabelereiro; quando ele chegou _ hotéis separados, devido às circunstâncias _, ela estava ainda mais apaixonada, e ele também. Qualquer paixão passando por Paris só faz aumentar, claro.

        Como estavam fazendo a linha discreta, tomaram os devidos cuidado e não foram a nenhum dos lugares a que estavam habituados, para não correrem o risco de encontrar amigos. Decidiram ir ao restaurante da Torre Eiffel, o Jules Verne, onde só vão turistas, eles achavam; lá não encontrariam nenhum conhecido, justamente por ser lugar de turista. Mas ela, quando viu lá de cima as luzes da cidade se acenderem _ como era maio, só anoiteceu em volta das 9h _, quase se emocionou.

Já estava combinado que passariam oito dias juntos, não mais, e o romance estava tão bom, mas tão bom, que no terceiro dia ele fez uma proposta: que ela escolhesse qualquer lugar do mundo para passarem o que seria o último fim de semana juntos. Mais romântico, impossível.

Ela pensou, pensou, pensou. Marrakesh? Uma ilha grega? Como mulher  vivida e prática, imaginou o tempo que levaria um taxi do centro de Paris até o aeroporto, o trânsito, o check-in, a chegada em outro país, desarrumar a mala, mandar passar o vestido para jantar, todas essas coisas. Sugeriu então ficarem em Paria e passarem o fim de semana no Hotel Ritz, o mais emblemtico e luxuoso da cidade, onde ela não havia, jamais, se hospedado.

Era primavera; ele passou de taxi para buscá-la, o quarto onde dormiriam juntospela primeira vez era lindo, com o teto todo pintado, com a janela dando para a Place Vendôme; se esqueceram de sair para jantar, pediram champagne e cerejas, e brindaram à vida e ao amor. Sabiam que esses seriam os últimos dias que passariam juntos e, sabiamente, não disseram uma só palavra sobre isso, nemfalaram sobre se reverem. Já sabiam que seria inútil e impossível ir adiante, que a graça daquela paixão era ser perfeita até o último segundo sem um só desgaste, um só momento ruim, e nem uma vez foi pronunciada a palavra futuro, já que ele não ia acontecer mesmo. Ela pegaria um avião na segunda feira às10h, ele pegaria o dele _ para outro destino _ às 2h da tarde.

Nessa manhã, ela fez tudo para que ele não percebesse, em nenhum momento, que estava um pouco triste, mas ele percebeu. Ela se deu conta disso quando entrou no taxi, olhou para a janela do quarto e viu que ele estava na sacada, olhando ela sair de sua vida para sempre. Se acenaram e nunca mais se viram.

Os anos passaram, mas ficou a lembrança; a lembrança do fim de semana que passou no quarto mais bonito em que já dormiu na vida.

E hoje pensa _ acha _ que todas as paixões deveriam ser assim.


domingo, 17 de junho de 2012

Sobre o assassinato


Domingo, 17 de junho de 2012, por Danuza Leão, para a Folha de S. Paulo


 A imprensa tem sido amável e discreta, com Elize Matsunaga; reproduziu o diálogo entre ela e seu (ex?) marido, do jeito que ela contou, claro, já que não havia ninguém presente, além dos dois. Ok, jornais e revistas devem ser imparciais, mas existe limite para tudo; em certos casos, até para a imparcialidade.

           Marcos Matsunaga estava traindo Elize? Estava, e se todas as mulheres tivessem o direito de matar os maridos que as traem, sobrariam poucos para contar a história. Ele ameaçou de tirar a guarda da filha dela? Todos dizem isso, nahora da separação. Foi encontrar a nova namorada no carro (dado por ele) deElize? Razão para uma certa simpatia pela esposa traída: um absurdo, ele usar o carro da própria esposa para sair com a outra. Ela estava visitando a família no Paraná, com a filha e a babá, enquanto ele a traia? Mais digna de simpatia ainda. Seu marido presenteou a nova namorada com um carro? Repetiu o que havia feito com Elize quando a conheceu, ainda casado. Na hora da briga ele a chamou de prostituta? É melhor mesmo que ninguém se lembre nem do que ouviu, nem do que falou nessa hora, tudo faz parte. Não costumam ser coisas amáveis, mas há muitos que esquecem e até fazem as pazes depois. Ele a agrediu, fisicamente? Nenhuma novidade, também costuma acontecer.

           Na vida real, muitas mulheres que se sabem traídas _ e sobretudo as que têm uma prova, como o vídeo feito pelo celular _ têm vontade de matar. Algumas até matam, a maioria não, mas que muitas têm vontade, isso têm. As que matam costumam ser rápidas; mulher não gosta de ver sangue.

           Segundo os jornais, Elize vai ser acusada de assassinato e ocultação de cadáver; não por esquartejamento _ esse detalhe não deve existir no Código Penal, como também não deve existir a antropofagia, coisas inadmissíveis na cabeça dos que fazem as leis.

           A morte de uma pessoa querida é sempre dolorosa; se for uma morte violenta, mais dolorosa ainda. Se seguida de esquartejamento, nem dá para imaginar o que deve ter sentindo a família de Marcos Matsunaga na hora do enterro. Não existem palavras para avaliar essa dor.

           A frieza de Elize é monstruosa. Eu teria medo de deixá-la sozinha com a própria filha, pois ela parece capaz de tudo, e não sei se existe um nome para definir umadoença tão, tão _ nem sei o que. Crimes como esse, confessados e comprovados, não merecem nem julgamento. Não gosto de pensar no que seus advogados vão dizer, na tentativa de absolvê-la; nessa hora, advogados são capazes de tudo.

           E choca ver que as pessoas não estão dando muita importância ao caso, e que estão tratando Elize como uma pessoa quase normal, com o respeito que se deve dar a qualquer ser humano; só que ela não é um ser humano, é um monstro, e monstros devem ser tratados como tal.

            Em outros tempos, certos crimes davam manchetes, e até nomes aos assassinos; quem já era nascido deve lembrar da “fera da Penha”. Nem lembro mais quem ela matou, mas de como ela era chamada não esqueci. Por que será que um crime tão hediondo como o de Elize quase não mobiliza ninguém, nem numa conversa entre amigos?

            Está faltando a capacidade de se indignar, e isso é preocupante.

domingo, 10 de junho de 2012

Da série " Coisas que eu não entendo "


Domingo, 10 de junho de 2012, por Danuza Leão, para a Folha de S. Paulo


 Existem muitas, e uma delas é quando ouço ou leio o comentário de um analista político dizendo que alguma coisa aconteceu por “pressão da opinião pública”. Até concordo que, em grande parte das vezes, isso tem a ver com o que eu acho, com o que acredito ser o mais certo; mas a mim ninguém perguntou nada, e não me consta que alguma pesquisa tenha sido feita para saber se a opinião públicaestá pressionando para um lado ou para o outro. No assunto mensalão, por exemplo: o julgamento tem _ enfim _ dia marcado para começar, mas existem, sabidamente, duas “pressões da opinião pública”. A dos que querem e exigem que isso aconteça, pois não é possível um caso tão escandaloso durar sete anos para ser julgado, e a dos petistas, que gostariam que levasse mais 30 anos e que tudo acabasse no esquecimento. E um pequeno comentário: como os ministros do STFadoram criar um suspense. O lento ministro Ricardo Lewandowski é um deles, e agora vamos esperar até não sei quando para que o ministro José Toffoli decida se vai se declarar suspeito ou não, no mesmo julgamento; afinal, ele já deve estar farto de saber se é ou não. Penso que faz parte, para mostrar à população o quanto são poderosos.
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            Outra coisa curiosa: sabe-se que em quase todos os países do planeta há uma tendência a que as pessoas passem a usar mais o transporte público ou a estimular o transporte solidário, para desafogar o trânsito, caótico nas grandes cidades. São Paulo inovou, com o rodízio, e, segundo li, está pensando fechar algumas ruas, a exemplo de Londres e Curitiba, para que algumas áreas sejam usadas apenas por pedestres. Pois às vésperas da Rio + 20 o governo baixa o preço dos carros para estimular as vendas, e as montadoras desovam milhares de carros dos seus pátios, o que vai infernizar ainda mais o trânsito das cidades (e os novos compradores serão, talvez, os próximos inadimplentes). Dá para entender?
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             Mais uma: é proibido o uso de celulares a quem esteja dirigindo, aliás, uma bela medida. Quem está no volante falando no telefone, seja no viva voz, seja naquela posição mais do que incômoda, equilibrando o celular entre o ouvido e o ombro, perde alguns reflexos, porisso, palmas para a decisão de multar e tirar pontos da carteira de quem não consegue esperar chegar a seu destino para se comunicar com o mundo. Mas já me aconteceu, várias vezes, de tomar um taxi, e ver, bem pertinho do rosto do motorista, uma mini televisão ligada, muitas vezes na novela. Ora, a TV é diabólica; se ela está ligada, seja em nossa própria casa, seja na sala de espera de um médico ou dentista _ o que, aliás, deveria ser proibido _ é inevitável que se olhe para ela. Agora imagine um motorista de taxi, que passa 10 horas dirigindo, e que, teoricamente, não tem com quem falar _ teoricamente, porque todos falam, ou com o passageiro ou no celular _ com uma televisão ligada bem na sua frente. É muito simples: não dá. Mas ainda não ouvi falar que exista nenhuma lei proibindo a existência dessas televisões nos carros, ou proibindo sua fabricação, o que seria bem prático; se não existissem TVs especialmente para carros no mercado, ninguém poderia comprar, e nem seria preciso lei alguma para punir os motoristas irresponsáveis.
              
Essas são apenas três, das muitas coisas que não entendo.

domingo, 3 de junho de 2012

Sobre abuso sexual



Domingo, 3 de junho de 2012, por Danuza Leão, para a Folha de S. Paulo


Ninguém sabe o que se passa na cabeça das pessoas, mas existem – homens, principalmente – que têm fantasias sexuais por meninas (ou meninos) muito jovens, sobretudo quando são meninas (ou meninos) bonitos; isso desde que o mundo é mundo, e acontece até no seio da Santa Madre Igreja. Esses, ou procuram pensar em outra coisa, ou cometem abusos, o que é crime hediondo.

           Mas qual a diferença entre uma menina e uma moça? Já era assim quando as adolescentes usavam saia pregueada e meia curta. Hoje elas imitam, desde bem novinhas, o que vêem na televisão: usam sapatos de saltinho, minissaia, baton e pintam as unhas. Pedófilos sempre existiram, existem e existirão, mais do que se imagina, mais do que se sabe. São pessoas com desordem mental, e quem não ouviu falar que em regiões mais atrasadas pais tiveram relações com uma ou mais filhas,tendo até engravidado algumas, que se tornaram mães de suas próprias irmãs.Isso acontece no Brasil profundo e também em países altamente civilizados; na Espanha, houve um bando de pedófilos que abusava sexualmente de crianças, até mesmo de bebês. A miséria humana não tem limites.

           A sexualidade das pessoas é um mistério; existem muitos homens, mais do que se imagina, que se altera, quando vê uma criança bonita. Acariciam uma perna, dizem que ela é linda, mas não vão adiante por saberem que esse desejo é pecado, é crime, é contra as leis da natureza, como preferirem chamar; alguns não passam disso, pois não chegam nem mesmo a terem consciência desse desejo.

           Mas as crianças percebem; não sabem o que está acontecendo, mas quando fogem do abraço de algum amigo do pai ou de um tio, é porque perceberam. Até pelo olhar elas sentem, criança não é boba. Intuem que alguma coisa está errada mas como não compreendem o que está acontecendo, não falam. Só se fala do que se entende, e acusar uma pessoa próxima da família de algo que elas mesmas não sabem o que é, está fora de questão. Têm pudor, e sabem que podem ser castigadas, por terem a cabeça “suja”. Cabe às mães e aos pais ficarem atentos, não deixarem suas filhas/filhos em situações de risco, olhar atentamente o que se passa, e desconfiar sempre, sem medo de estar pensando em “maldades”, sabendo que essas coisas acontecem nas melhores famílias. Não vivemos em um mundo ideal.

            O abuso sexual causam um efeito devastador nos que o sofrem, e precisam de apoio profissional, apoio esse que deve ser forte e positivo; só o amor de mãe e pai não é suficiente. Elas devem aprender a levantar a cabeça, e olhar a vida de frente, deixandoesse triste momento para trás, no lugar de sofrer por toda a existência; passaram por um péssimo momento, como poderiam ter sido atropeladas por um carro ou levado uma facada de um assaltante.

           Houve gente que perdeu a família inteira na guerra, ou durante o tsunami, ou nas torres gêmeas de Nova York, ou no terremoto de Tokio, mas conseguiu superar. Coisas ruins acontecem, mas  devem e podem ser também superadas, e o estupro é uma delas.

            A condição humana é uma miséria.