Domingo, 20 de junho de 2010 por Danuza Leão, para a Folha de S. Paulo
Qual a coisa mais preciosa do mundo, mais que o ouro, que todos os diamantes, todas as moedas fortes, toda a riqueza e poder da terra? Acertou quem respondeu o tempo.
Coisa misteriosa este tal de tempo. Quando você não tem absolutamente nada para fazer, ele não passa, e se fica esperando que chegue a noite, e o dia seguinte, quase em desespero. Mas quando a vida está movimentada e boa, ele voa, e quando você se dá conta, a semana acabou sem saber como, e o mês também, e foram-se os anos. Não há meio termo: ou se morre de tédio ou de exaustão. O que é melhor? Difícil escolha.
Quando não se faz nada, sobra tempo para pensar em coisas que nos fazem ou fizeram sofrer, lembrar do passado com arrependimento, saudades, ou, o pior de tudo, com a sensação de não ter vivido -pensamentos, aliás, absolutamente inúteis. Quando o tempo sobra, qualquer palavra que se ouve é analisada, o contexto em que ela foi dita pode ter proporções perigosas, e até o tom de voz tem -ou pode ter- um grave significado.
Se seu porteiro diz alguma coisa que não te soa bem, é uma punhalada no coração, e quem tem o dia pela frente para ficar remoendo o que ouviu vai viver um drama, pois nada para fazer de uma bobagem uma grande tragédia como uma boa tarde ociosa. Mas pergunte a alguém, com dois empregos, quanto tempo dura o sofrimento. Exatamente o tempo entre a casa e o trabalho; na fila para o ônibus, o problema já acabou.
Ah, o tempo; o tempo que não se tem para ouvir a amiga, para escutar o problema do filho, o tempo que ninguém tem para escutar os nossos. E como não se pode viver sem ter com quem falar existem, felizmente, nossos queridos analistas, que dedicam 50 minutos inteirinhos só a nós, ouvindo todas as bobagens e nos compreendendo, sem que o telefone toque ou que a empregada bata na porta pedindo dinheiro para comprar carne.
Coisa mais curiosa; quando você está esperando ansiosamente por alguém que marcou de chegar às nove -e você às oito já está pronta, claro-, é capaz de passar uma hora inteira olhando para o relógio, e só para isso foi inventado o ponteiro dos segundos; para se ter certeza de que o tempo passa. Por outro lado, se estiver com o homem que mais ama fazendo a mais maravilhosa viagem, quando se der conta ela já acabou, sem deixar uma só prova de que tudo existiu, a não ser na memória e em algumas vagas fotos. Só que um dia, quando você estiver amando outra pessoa, já terá esquecido -como tantos se esqueceram de você. O tempo, remédio para tantas coisas, mas que demora tanto para fazer efeito.
O tempo não tem forma, cheiro, sabor; não pode ser comprado em farmácias, ser dado nem emprestado, não é vegetal, animal nem mineral, não pode ser guardado no cofre, não pode ser esbanjado, nem é possível economizá-lo para o futuro. Ele não existe, e ao mesmo tempo só ele existe.
E o homem, que já conseguiu tantas proezas, como voar, chegar à lua, ser mais veloz que o som, fazer chover, transformar a água do mar em água doce, irrigar os desertos, só não conseguiu ainda dominar essa coisa tão preciosa e abstrata que é o tempo.
PS - Estou saindo de férias, estarei de volta dia 25 de julho, até lá.
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