segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Tão bela e tão brega



Domingo, 27 de março de 2011, por Danuza Leão, para a Folha de S. Paulo

ELIZABETH TAYLOR foi a mulher mais bonita do cinema; existiram outras, 
também deslumbrantes, mas que não tiveram seu brilho de estrela. Até
tiveram, mas por um tempo curto. Ava Gardner, Garbo, Kim Novak e
outras beldades, aos primeiros sinais de envelhecimento, se trancaram
em casa -em muitos casos bebendo- para não serem mais vistas, mas não
ela.
Elizabeth, depois dos sets de filmagem, continuou no palco da vida, e
nunca desistiu de ser feliz; foram oito casamentos, um recorde.
Uma de suas declarações: "nunca dormi com homem algum, a não ser com
meus maridos; que mulher pode dizer a mesma coisa?"
Se disse a verdade, nunca vamos saber, mas é bem possível. No fundo,
ela era conservadora -à sua maneira.
A beleza de Elizabeth não se limitava aos olhos: tinha um nariz
perfeito e seus traços eram de uma harmonia de tirar o fôlego.
Um rosto tão bonito fazia esquecer sua baixa estatura, os seios
grandes demais para seu tamanho -e sempre foi gordinha.
Tendo passado a vida inteira em estúdios de filmagem, sempre como
grande estrela, ela nunca soube o que era a vida normal. Achava que
tinha direito a tudo, como uma menina mimada.
Uma vez uma fã chegou perto dela e disse as coisas convencionais, tipo
"você é linda, te adoro" etc. Essa mulher tinha na lapela um broche
com um magnífico diamante; Liz olhou e disse, candidamente: "quer me
dar de presente?"
Para ela, isso seria normal. Detalhe: a mulher não deu.
De outra vez, estava no baile Proust, no fabuloso castelo Ferrières,
dos Rothschild, e quando a anfitriã, Marie Helène, se queixou da
despesa para manter a imensa casa, ela perguntou: "por que você não dá
para mim? Eu e Richard (Burton) poderíamos cuidar dela". A realidade,
para Elizabeth, não existia, ou melhor, ela não conhecia.
Muito álcool, muitas drogas, muitas plásticas, muito botox. Em sua
última imagem, a deslumbrante atriz estava quase irreconhecível; seu
rosto estava deformado, inchado, uma desolação. Mesmo assim, nunca se
escondeu dos fotógrafos nem deixou o palco, não mais do cinema, mas
dos acontecimentos.
E era uma boa amiga: quando Peter Lawford foi internado na clínica
Betty Ford por seus excessos, ela se internou também, para dar uma
força, e seu copeiro ia todos os dias servir a refeição predileta de
seu amigo. Elizabeth passou a vida rodeada por gays, e não ouvi falar
que tenha tido nenhuma amiga mulher, a não ser Debbie Reynolds, de
quem roubou o marido sem a menor cerimônia.
Ela era tão bonita que ninguém nunca notou o quanto era cafona. À
medida que o tempo foi passando, seus penteados e suas roupas eram o
suprassumo da breguice de Hollywood, cidade campeã no quesito. Mas sua
beleza era tão grande que ela podia se dar ao luxo de se vestir
absurdamente mal.
Dependendo dos papéis que representava, quanto mais despojada, mais
natural e mais simples, mais deslumbrante era.
E corajosa: tinha uma saúde frágil, e depois de uma cirurgia na qual
foi submetida a uma traqueostomia, saiu do hospital direto para uma
festa, com um colar que era um fio de platina e um grande diamante
cobrindo a cicatriz do pescoço. E passou a noite dizendo, sorrindo: "é
uma espécie de band-aid que eu inventei".
Foi a última estrela de uma época que com sua morte acabou para sempre.

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